segunda-feira, 14 de maio de 2012


Ameaças e Estratégias de Geoconservação

O passado da Terra não é menos importante que o da Humanidade.
Está na hora de aprendermos a conhecê-lo; é uma memória anterior à do homem”.
Adaptação do Artigo 7º da Declaração Internacional
dos Direitos a Memória da Terra

A geologia (...) não é a única ciência da natureza. Nem sequer é a única ciência da Terra, mas é a única que nos conta a história da Terra e da natureza
(Alvarez et al.1992b, in Carneiro et al, 2004)

Algumas pistas como “pegadas” estão entre as mais importantes do legado iconológico a nível mundial. Salienta-se também e de acordo com classificação em 2006, pela UNESCO, do primeiro Geoparque português – Naturtejo (http://www.naturtejo.com/conteudo.php?id=19). Estas e outras heranças revelam a história da Terra, constituindo arquivos que o geólogo aprendeu a decifrar. Alguns destes "documentos" são tão frágeis e de uma raridade tal, que se torna premente protege-los das ameaças externas de forma a perpetuarem a sua história ao longo das gerações.

 Fig 1: Portas de Ródão




Cada ocorrência geológica necessita pois de ser estudada e avaliada quanto ao seu significado, importância patrimonial, conceito e estratégia de desenvolvimento. Se há formações litológicas bem representadas no nosso país, outras são raras ou apresentam características que possuem um nível tal de informação, cujo desaparecimento representa um hiato no conhecimento da geo-história e evolução geológica do nosso planeta em geral, da Europa e da Península Ibérica em particular.

Numa época em que existe uma consciência global de que a herança geológica está dispersa pelas várias regiões do Globo, é necessário que sejam definidos padrões internacionais e de avaliação do Património Geológico (PG) de cada região/País.

A maior parte das ameaças advém, direta ou indiretamente, da atividade humana, que, com os padrões atuais de vida de uma sociedade industrializada, obriga à utilização da geodiversidade e, em alguns casos, à sua destruição.

A geodiversidade é vulnerável perante ameaças bem concretas. Apesar dos geoelementos supostamente apresentarem grande durabilidade e resistência, devido à ideia errada das rochas perdurarem no tempo, tal como surgiram e apresentarem imutabilidades, para o comum cidadão, não deixam de correr riscos e serem vulneráveis no espaço e no tempo. Segundo Brilha (2005), podem enumerar-se algumas ações adversas, a saber:

     1.  Exploração de recursos geológicos;
     2.  Desenvolvimento de obras e estruturas;
     3.  Gestão das bacias hidrográficas;
     4.  Florestação, desflorestação e agricultura;
     5.  Atividades militares;
     6.  Atividades turísticas e recreativas;
     7.  Colheita de amostras para fins não científicos;
     8.  Iliteracia cultural.

Estes tipos de ameaças ao Património Geológico bem reais e inerentes ao desenvolvimento socioeconómico das populações, deverão estar contempladas nos regulamentos dos vários instrumentos de ordenamento e gestão (IOG), como atividades interditas ou condicionadas, mediante parecer vinculativo dos organismos competentes, salvaguardando estes valores.

Considera-se que a geodiversidade pode igualmente ser utilizada em abono do Homem, sendo a mesma, alvo de estratégias de geoconservação devidamente fundamentadas, aplicadas e utilizadas de forma sustentável, como georrecurso. Uma das formas é o geoturismo. Como Brilha (2005) refere: O geoturismo é uma actividade que se baseia na geodiversidade.

Fig 2: Passeio de Geoturismo

 



Ainda segundo Brilha (2005), o geoturismo procura minimizar o impacte ambiental e cultural exercido sobre os locais e populações, que recebem este tipo de turistas. Este caracteriza-se por:
  •  Respeitar os destinos turísticos pela aplicação de estratégias de gestão de modo a evitar modificações nos habitats naturais, no património cultural e paisagístico e na cultura local;
  • Conservar os recursos e minimizar a poluição, o lixo, o consumo energético e o uso de água;
  •  Respeitar a cultura local e tradições;
  •  Promover a qualidade em detrimento de quantidade;

As vantagens deste tipo e turismo relativamente ao tradicional são (Brilha, 2005):

*      Pode complementar a oferta em zonas turísticas;
*      Pode desviar turistas de locais sobrelotados;
*      Não está restrito a variações sazonais tornando-o atrativo ao longo de todo o ano;
*      Não está dependente dos hábitos da fauna;
*      Pode promover o artesanato com motivos ligados à geodiversidade local.

Segundo o Plano Estratégico Nacional de Turismo, o turismo da natureza, que é definido como um dos 10 produtos estratégicos prioritários para promover Portugal, pode potenciar determinadas áreas porque, considera o setor do geoturismo, como um dos que apresenta maior vocação para o desenvolvimento do
turismo, assim como a educação, onde é promovida a divulgação científica, ambiental e cultural, através de percursos, visitas guiadas, identificação dos geossítios e sua proteção, material educativo e variados programas temáticos; apoiando a investigação científica. Este tipo de turismo com grandes potencialidades deverá englobar o conceito de turismo sustentável.

O termo Geoconservação refere-se à conservação do património geológico que deverá passar por medidas concretas e específicas, focadas no tipo de património avaliado. Segundo Sharples (in Brilha, 2005, pag. 51), a geoconservação tem como objetivo a preservação da diversidade natural (ou geodiversidade) de significativos aspectos e processos geológicos (substrato), geomorfológicos (formas de paisagem) e de solo, mantendo a evolução natural (velocidade e intensidade) desses aspectos e processos.”

Foi a 5 de Maio de 2004 que o Conselho de Ministros do Conselho da Europa, adotou a Recomendação Rec(2004)3, sobre a Conservação do Património Geológico e Áreas de Especial Interesse Geológico, dirigida aos governos dos estados membros, constituída em traços gerais por sete pontos (http://www.geopor.pt/progeo/):

1. "identifiquem nos seus territórios áreas de especial interesse, cuja conservação e gestão pode contribuir para a protecção e enriquecimento do PG nacional e europeu; neste contexto, deverão ter em conta organizações existentes e programas de geoconservação em curso;

2. desenvolvam estratégias nacionais para a proteção e gestão de áreas de especial interesse geológico integrando a inventariação, a classificação de locais, a construção de bases de dados, a monitorização das condições dos locais de interesse geológico e a sua gestão turística, de modo a garantir a utilização sustentável destas áreas através de uma correcta e adequada gestão;

3. reforçar os instrumentos legais existentes ou desenvolver novos, de modo a proteger áreas de especial interesse geológico e bens geológicos móveis (colecções museológicas, por ex.) fazendo uso das convenções internacionais implementadas;

4. apoiar a informação e os programas educativos de incentivo à promoção da geoconservação;

5. reforçar a cooperação com organizações internacionais, instituições científicas e ONG no domínio da conservação do Património Geológico;

6. orçamentar recursos financeiros adequados para apoiar as iniciativas propostas;

7. elaborar em 2009, um relatório para o Conselho da Europa, de modo a ser feita uma avaliação europeia sobre o impacto da Recomendação Rec(2004)3."

Este documento recomenda a todos os estados membros que promovam a identificação e proteção do seu Património Geológico.


A Serra de Monchique é apenas um de muitos exemplos existentes de Património Geológico no nosso país. Esta, evidencia dois cumes gémeos de origem vulcânica – a Fóia e a Picota – que atingem 902m e 744m de altitude, respectivamente. É assim considerado um maciço erutivo que emergiu há cerca de 70 milhões de anos dos terrenos do carbónico marinho, existindo na zona de contacto geológico uma orla de metamorfismo com formações rochosas próprias. Os cumes citados – as mais altas elevações do Algarve (e do Sul de Portugal) – são constituídos por sienito, rochas afins do granito. Reconhecem-se aqui duas raras variedades de sienito: foiaíte e monchiquite.

               Fig 3: Fóia – Serra Monchique            
 
  
  Fig  4: Picota – Serra de Monchique   

  
                                   
Fonte: www.google/Fóia e Picota/imagens

Estas formações rochosas podem estar sob risco, devido aos consecutivos incêndios que deflagram todos os anos, pela altura do Verão, nesta zona. Este flagelo é originado pelo descuido na limpeza das matas, pela florestação incorrecta da zona com espécies não nativas e por mão criminosa. Quando não existe vegetação, após um grande incêndio, as rochas e o solo arável estão mais suscetíveis às ações da água, na altura das chuvas e do vento.

Citando o autor australiano Sharles (2000), a Geoconservação não só é fundamental “para a manutenção da biodiversidade mas também porque a geodiversidade, só por si, tem um valor intrínseco, mesmo que não se encontre diretamente associada a qualquer forma de vida”. 




Referências:

BRILHA, J. (2005) Património Geológico e Geoconservação: A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica. Palimage Editores, Viseu


http://www.geopor.pt/progeo/, consultado em 2012-05-14

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